
26 mar 85% das viagens são canceladas em 1 mês, e agências temem onda de falências
O avanço da pandemia do novo coronavírus pelo mundo colocou em risco não apenas as companhias aéreas, mas também diversas agências de turismo e até redes de hotéis. Desde o início da crise, o setor tem sido um dos mais impactados com o cancelamento de viagens e queda na procura.
Segundo dados da Abav Nacional (Associação Brasileira de Agências de Viagens), neste mês já houve uma taxa de cancelamentos de viagens de 85%. Além de lidar com pedidos de reembolso, a receita tem sido próxima a zero nos últimos dias em alguns casos.
O economista Luis Alberto de Paiva, presidente da Corporate Consulting, especializada em reestruturação financeira e de gestão de empresas, avalia que nos próximos meses deve haver uma onda de pedidos de recuperação judicial.
“Se a empresa não tem como fazer os pagamentos dela, está sujeita a pedidos de falência e penhora de ativos. A recuperação judicial acaba tendo um efeito imediato de fazer proteção dos ativos e evitar que essa empresa se convole em um processo falimentar”, afirmou.
Estimativa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) aponta que somente na primeira quinzena de março, o volume de receitas do setor de turismo brasileiro caiu 16,7% m relação ao mesmo período do ano passado. Isso representa uma perda equivalente a R$ 2,2 bilhões, segundo a CNC.
O cenário pode piorar ainda mais nos próximos dias. O secretário de Turismo de São Paulo, Vinicius Lummertz, prevê um cenário dramático para abril e maio, com o cancelamento de todos os voos internacionais no Brasil e queda de 80% nos voos domésticos.
Onda de falência e recuperação judicial
A associação das agências de viagem vê o cenário como a maior crise vivenciada pelo setor na era atual. “Prevemos um altíssimo índice de falências entre as empresas relacionadas ao turismo, resultando em milhares de pessoas desempregadas e impactos diretos e indiretos no PIB brasileiro”, afirmou a associação.
Segundo a CNC, os prejuízos já sofridos pelo setor têm potencial de reduzir até 115,6 mil empregos formais. A Abav afirma que o setor emprega cerca de 3 milhões de trabalhadores no país.
“As empresas não têm caixa para se manter diante de um quadro tão tenebroso. O terceiro setor recruta muita mão de obra, diferentemente da indústria e da agricultura, que já estão altamente mecanizados e com inteligência artificial. Vamos ser profundamente atingidos, pois as empresas não têm sequer horizonte do tempo que vai levar a crise e da necessidade de recuperação”, afirmou José Roberto Tadros, presidente da CNC.
Quedas de 80% na Bolsa
Grandes empresas do setor têm sofrido perdas significativas. Desde o início do ano, as ações da CVC na bolsa de valores de São Paulo já caíram 81,2%. A queda é similar à das companhias aéreas Gol (-80,2%) e Azul (-76,3%).
Apesar da queda significativa das ações, o economista Luis Alberto de Paiva avaliou que a situação é ainda mais complicada para as agências de turismo de pequeno porte. “A CVC tem a participação de fundos que teriam a capacidade de fazer aporte financeiro. Já as pequenas não têm essa condição e ainda enfrentam dificuldades para conseguir empréstimo”, afirmou.
Para o economista, deve haver uma mudança significativa no cenário após a crise. “Deve haver um processo de aquisição das pequenas agências para a consolidação do mercado”, avaliou.
Hotéis fecham as portas
O cancelamento das viagens afeta diretamente o setor hoteleiro. O hotel Bourbon Convention Ibirapuera, um dos maiores da cidade de São Paulo com mais de mil apartamentos, ficará fechado a partir da próxima segunda-feira (23). A medida vale, inicialmente, até o dia 3 de maio.
Em Santa Catarina, um decreto do governador Carlos Moisés (PSL) proibiu a entrada de novos hóspedes no setor hoteleiro de todo o estado. A medida entrou em vigor na última quarta-feira (18) e tem validade inicial de sete dias.
Campanha contra cancelamento
Para evitar um impacto generalizado nas finanças das empresas do setor de turismo, a Abav aderiu à campanha para que os consumidores apenas adiem seus planos de viagem em vez de cancelar a passagem. Isso evitaria que as empresas tivessem de arcar com custos de reembolso em um momento em que enfrentam uma queda drástica no faturamento.
“O consumidor que adia sua programação para o futuro garante sua segurança e ainda colabora com este setor, que tem grande peso na economia nacional e mundial, englobando atividades como restaurantes, hospedagens e similares, transportes de passageiros, agências de viagens, cultura e lazer”, disse a associação.
Segundo a WTTC (World’s Travel and Tourism Council), o setor é responsável por empregar 319 milhões de pessoas ao redor do mundo. Em 2018, sua contribuição ao PIB foi de aproximadamente 10,4%, com uma soma de US$ 8,8 trilhões. No país, a estimativa dessa contribuição para o PIB foi de 8,1%.
Reivindicação do setor
O governo anunciou nesta semana medidas para auxiliar as companhias aéreas e os aeroportos. A prorrogação do prazo de reembolso em até 12 meses auxilia também as agências e hotéis, já que é um incentivo para o passageiro remarcar o bilhete em vez de cancelar a viagem.
A Abav espera, no entanto, que outras medidas sejam anunciadas pelo ministério do turismo nos próximos dias. As principais reivindicações são:
.Disponibilização de linha de crédito especial na Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil para as empresas de turismo, com carência para início do pagamento de no mínimo seis meses.
.Aprovação de decreto para postergar o pagamento de impostos relativos à folha de pagamento, também por seis meses, desde que quitados no exercício de 2020.
.Liberação do saque do FGTS para funcionários de empresas que exerçam atividade turística.
.Parecer favorável do ministério da Justiça em relação à remarcação de viagens contratadas pelo consumidor, frente ao cancelamento e devolução de valores. A Abav alega que as agências não possuem reservas hoje para realizar a devolução de valores e a remarcação da viagem seria uma solução para manutenção do negócio sem prejudicar o consumidor.
.Redução do IRRF a 0% nas remessas para pagamentos de serviços turísticos ao exterior.
Fonte: Aero Magazine